30 de março de 2010

HOMENAGEM A ARMANDO NOGUEIRA

O jornalista e cronista Armando Nogueira morreu ontem, por volta das 7h, em seu apartamento. Armando sofria de câncer no cérebro desde 2007. Para prestar uma homenagem a este grande nome o jornalismo brasileiro, colocamos a última coluna escrita por ele no jornal Lance!, em 2005.
Livre, leve e solto
Esta crônica é pra saudar a coincidência da chegada do Campeonato Brasileiro com o meu retorno ao jornalismo impresso. O futebol é uma das coisas boas da minha vida. Mas confesso que andava meio enfastiado, não de ver, nem de falar, mas de escrever. Depois de passar meio século cortando palavras, decidi que tinha chegado a hora de me conceder umas férias.
Quem escreve sofre, na carne, as dores da tortura mental. A busca da palavra exata será sempre um suplício. Conheci três exemplos dignos de minha inveja: Carlos Lacerda, Otto Lara Resende e Carlos Castelo Branco. Nunca vi tamanha fluidez.
Os três escreviam artigos e reportagens com espantosa velocidade. Será que escreviam, assim, tão depressa porque não eram poetas?
Dizem que o poeta sofre mais que o prosador. Carlos Drummond de Andrade sentia febre quando começou a escrever.
Não vou nessa conversa de que a prosa flui mais facilmente, sem dor, que a poesia. Hemingway rescreveu 39 vezes a última página de "Adeus às armas".
O clássico preceito de que escrever é cortar palavras exprime, à perfeição, o tormento de quem vive desse ofício. Mero escriba de jornal, confesso que morri de inveja do que se passou com o Otto Lara Resende.
Otto trabalhava na TV Globo. Escrevia à máquina, de frente para a parede. Um contínuo vem trazer uma correspondência. Vê a porta entreaberta e pâra diante da cena. Otto, como um possuído, despejando na lauda um texto sem tréguas, nem fim. O "boy" se anuncia, com uma pergunta:
- O senhor é datilógrafo?
- Sou - responde Otto.
- Bom datilógrafo eu conheço muitos, mas que tenha redação própria, o senhor é o primeiro que eu vi.
Bem que eu pretendia escrever sobre o Campeonato Brasileiro. Mas, me faltou a selva que alimenta o escriba. Enfim, já que o LANCE! me contratou, achando que eu tinha fôlego para encarar um Campeonato Brasileiro, aqui estou. Tentarei dar uma de Romário, cuja presença solitária, pelas imediações da grande área, me lembra sempre uma das figuras mais curiosas da gramática portuguesa. É o anacoluto. A palavra fica boiando na oração, livre, leve e solta.
Serei um coroa anacoluto, vagando entre os brilhantes colunistas do LANCE!.

Foto da Agência Estado

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